quinta-feira, abril 22

Voltando à barbárie...


Agora comecemos a diversificar mais os nossos assuntos; desta vez, tentando ser um pouco mais técnicos, se assim se pode dizer. Queremos, na verdade, discutir conceitos, enunciar hipóteses, emular posições; enfim, que aqueles que lerão estas linhas e outras, participem.
A proposta, mais do justa, em nosso século, é uma questão da crise da racionalidade e, por este motivo, diria antropológico, social e cultural. Tudo isto pode parecer a mesma coisa, mas, são coisas distintas, entretanto, interconectadas. Não se pode, assim, analisá-las num contexto restritos, particularizadas, alheias umas as outras, porém, imbricadas, afins.
Desta maneira, quando nos referimos a estes problemas, queremos com isto, dizer que o problema do Homem é mais atual do que nunca; ou melhor, nunca deixou sua atualidade!
Neste post resolvemos ressaltar algumas coisas que vemos nos telejornais, revistas, jornais, web e outros sobre a preocupação do Homem com o seu hábitat, os meios de subsistência, o próprio desenvolvimento sustentável; o paradoxo do desenvolvimento versus o Homem. Esta situação é explicitada no barbarismo do Homem em relação à natureza e em relação a ele mesmo. Para lembrar as palavras de Marx, "a matéria é humanizada e o humano coisificada".
Andamos analisando fatos históricos e percebemos que, em toda a história houve um "q" de barbárie; diga-se de passagem para os [ignorantes de plantão] que barbárie não esteve e nunca estará relacionada, diretamente, com Idade Média. Esta ferocidade esta contida no Homem. Se não o fosse, como explicaria tais acontecimentos como as Guerras Mundiais, o Neocolonialismo, a Teoria da Eugenia, o Apartheid e mesmo os fatos que relacionados àqueles podem ser considerados corriqueiros. O próprio Nietzsche diz que a mansidão do Homem se dá pela inversão de valores e sua doutrinação fazendo com que viva arrebanhado: Na Genealogia da Moral compara como a fera aprisionada que se bate contra as barras da jaula; no Anticristo, diz que o Homem vive em manadas. São conceitos que precisam ser bem trabalhados pois são um tanto complexos e nós o faremos futuramente. A única coisa que se precisa entender num primeiro momento é que ele não compara o Homem a um animal, mas, este se torna pelo adestramento moral que recebe através da doutrinação.
Na verdade, se analisarmos bem, veremos que em primeira instância este adestramento vem da religião, considerada por Marx como superestrutura. Mas esta doutrinação pode ser qualquer outra coisa que ponha um contra outro: política, status quo, status socialis ou até mesmo o esporte. Os paradigmas vão se formando e estratificando a sociedade.
Há uma baixeza assaz grande no Homem que o compromete. Basta vermos um escrito de Nietzsche - Assim falou Zaratustra (1883-85):
"Zaratustra falou assim ao povo: 'eu vos anuncio o Super-homem'. 'O homem é superável. Que fizeste para o superar? Até agora todos os seres têm apresentado alguma coisa superior a si mesmos; e vós, quereis o refluxo deste grande fluxo, preferis tornar ao animal, em vez de superar o homem?' 'Que é o macaco [símio] para o homem? Uma zombaria ou uma dolorosa vergonha'. 'Pois é mesmo que deve ser o homem para o super-homem: uma irrisão ou uma dolorosa vergonha'. 'Percorrestes o caminho que medeia do verme ao homem, e ainda em vós resta muito do verme. Noutro tempo fostes macaco, e hoje o homem é ainda mais macaco do que todos os macacos.'" (Op. Cit., p. 25)
Vejamos. Zaratustra aí representa a superação de toda aquela proposta que vinha das tradições religiosas, que não deram conta de transformar o Homem num ser tal e qual. Assim, o profeta, ao contrário de Cristo ou Maomé, pensa em anunciar ao povo que este deve por si a própria superação: vulgarmente dizendo "virar gente"! Note-se que a tradução em português é um tanto falha "Super-homem". Em alemão, Nietzsche usa o termo "Übermensh"; über vem oben que quer dizer acima, portanto, um Homem que esteja acima desta natureza caduca. Por isto, quando diz que o macaco é uma vergonha para o Homem, o Homem hodierno também deve ser para aquele que alcançar sua elevação moral. Fazendo alusão ao evolucionismo de Darwin, Zaratustra questiona o seguinte: se o Homem conseguiu evoluir de um mísero verme para um antropóide, por que nele ainda estão o resquício de verme e antropóide?
Esta breve passagem dá margem para uma larga reflexão. Pare e reflita estas linhas e olhe: Nietzsche escreveu isto no final do século XIX! O que o Homem é hoje? Verme ou Super-homem? A gente se fala...


NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Assim falou Zaratustra. São Paulo : Martin Claret, 2001.

Gravura: A criança presenciando o nascimento do Homem (Child watching the birth of man) de Salvador Dali.


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